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Bandeira e mapa do Couto Misto |
O
Couto Misto, ou Couto Mixto, foi um microestado ou
república, independente de facto,
do século X ao século XIX, situado entre os então reinos de
Portugal e Espanha, na zona raiana entre Trás-os-Montes e a Galiza,
no vale do rio Salas.
A
origem do Couto Misto não é clara, mas terá tido início no século
X. Na baixa idade média era defendido pelo castelo da Piconha,
localizado a leste de Tourém. Pelo Tratado de Lisboa, de 1864, este
castelo passou para soberania espanhola. O Couto esteve vinculado,
por foral das Terras da Piconha, à Casa de Bragança, mas sem
ligação à coroa portuguesa nem à espanhola. Desde finais do
século XV também houve relações entre o Couto Misto e a Casa de Lemos e Monte-Rei. Eclesiasticamente formava uma única paróquia e estava
ligado à diocese de Ourense, tal como Tourém.
A
maior parte do território do Couto Misto, hoje em dia sob domínio
espanhol na Galiza, era constituído pelos lugares de Santiago de Rubiães
e Rubiães dos Mistos (Rubiás dos Mixtos) — ambos na atual paróquia de Rubiás
dos Mistos, no concelho de Calvos de Randim — e Miãos
(Meaus, ou As Maus) — na paróquia de Tosende, no concelho de
Baltar. Também fazia parte do Couto Misto uma pequena faixa
desabitada que pertence agora ao concelho português de Montalegre. A
capital era em Santiago, onde se reunia a assembleia popular no adro da igreja; na igreja de Santiago estava guardada a arca com todos os documentos do Couto Misto. Rubiás era a maior povoação. Meaus era o principal núcleo económico e comercial. Os habitantes usufruíam ainda do Caminho
Privilegiado, uma via neutra que atravessava território concelho de
Calvos de Randim, na Galiza, até ao antigo concelho de Tourém, em Portugal.
Igreja de Santiago |
- Podiam prescindir da nacionalidade portuguesa ou espanhola, ou escolher uma delas; sendo considerados como "mistos" ou “cidadãos do Couto”, não estavam obrigados a utilizar documento de identidade português nem espanhol.
- Não participavam no exército português nem no espanhol.
- Exerciam o autogoverno democrático, com assembleias populares, elegendo em cada três anos um juiz ou alcaide que desempenhava as funções governativas, administrativas e judiciais, auxiliado pelos homens de acordo e pelos homens-bons eleitos nas três povoações (Santiago, Rubiás e Meaus). Até 1834 o alcaide era ratificado pelo juiz de Montalegre.
- Não necessitavam de licença de porte de armas, quer dentro do Couto, quer no Caminho Privilegiado.
- Não pagavam direitos de registo de propriedade nem outras contribuições ou impostos a Portugal ou Espanha.
- Não podiam ser detidos pelas autoridades portuguesas ou espanholas até uma légua do Couto nem no Caminho Privilegiado.
- Podiam negar alojamento às forças militares portuguesas ou espanholas.
- Frequentavam as feiras das povoações limítrofes portuguesas e galegas, fora do Couto, sem pagar direitos nem estar sujeitos a controlo alfandegário.
- O trânsito de pessoas e mercadorias no Caminho Privilegiado não podia ser perturbado pelas autoridades portuguesas nem espanholas.
- Podiam cultivar todos os géneros, inclusive os que eram sujeitos a controlo especial em Portugal ou Espanha (como por exemplo tabaco).
- O Couto Misto permitia o direito de asilo, não sendo possível às autoridades portuguesas ou espanholas perseguir indivíduos no território, a não ser em casos especiais como por exemplo homicídio.
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Mapa de Tourém, Randim e Couto Misto |
Os
privilégios e a independência de facto do Couto Misto
terminaram com a partição luso-espanhola por meio do Tratado de
Limites de 1864. Em 1868 deu-se a anexação formal com a entrada em
vigor das das disposições do tratado luso-espanhol. Em 1906 os
governos português e espanhol reconheceram o uso comum de terras
para pastoreio nos dois lados da raia, mas sem alterar os limites da
fronteira fixada em 1864.
Excertos
do Tratado de Limites, na ortografia original:
«Desde
as Pedras de Malrandin se dirigirá a raia em direcção N. pela
actual linha de separação entre o Couto Mixto e o termo de Villar,
até ao ponto em que a corte um alinhamento recto, tirado do Castello
da Piconha ao Pico de Monte Agudo, e d’este ponto de encontro
voltando em direcção E., continuará por outro alinhamento recto
até ao Porto de Banzellos. Portugal renuncia a favor de Hespanha
todos os direitos que possa ter sobre o terreno do Couto Mixto, e
sobre os povos n’elle situados, os quaes em virtude da direcção
determinada pela linha acima descripta ficam em territorio hespanhol.
(…)
O
povo promiscuo de Soutelinho pertencerá a Portugal,
demarcando-se-lhe, em territorio de Hespanha, uma zona de noventa a
cem metros de largo contigua á povoação. (...) Os dois povos
promiscuos Cambedo e Lama de Arcos, com seus actuaes termos
municipaes ficam pertencendo a Portugal. (…)
Havendo
passado integralmente ao dominio e soberania de Portugal, em virtude
dos artigos 10.º e 11.º os tres povos promiscuos denominados
Soutelinho, Cambedo e Lama de Arcos, e ficando igualmente sob o
dominio e soberania de Hespanha, em virtude do artigo 7.º, os tres
povos do Couto Mixto, chamados Santa Maria de Rubias, S. Thiago e
Meaus, convem ambas as partes contratantes, que tanto os habitantes
dos povos promiscuos que sejam realmente subditos hespanhoes, como os
habitantes do Couto Mixto que sejam realmente subditos portuguezes,
possam, se assim lhes convier, conservar a sua respectiva
nacionalidade. Para este fim tanto uns como outros declararão a sua
decisão ante as auctoridades locaes no termo de um anno, contado
desde o dia em que se ponha em execução o presente tratado.»
Meaus |
O
interesse histórico e cultural pelo Couto Misto ressurgiu na década
de 1990, com atividades da Universidade de Vigo e da Universidade de
Trás-os-Montes e Alto Douro, assim como a criação da Associação
de Amigos do Couto Misto (Asociación de Amigos do Couto Mixto)
e em 2003 a Associação Comunitária do Couto Misto (Asociación
de Veciños do Couto Mixto).
A
origem do nome do Couto Misto parece estar em “misto”,
“misturado”, devido à mistura dos diferentes povos ou às
relações mistas com as Casas de Bragança e de Monte-Rei. Contudo,
também há quem defenda que o nome tem origem em “místico”.
A
palavra couto tem os seguintes significados: terra coutada, defesa,
privilegiada; sítio vedado; conjunto de terras ou povoações que
pertenciam a um nobre, mosteiro, senhorio, etc; terreno comunal,
conjunto de terras que formam um todo; limite, término; refúgio,
abrigo ou asilo, em sentido figurado. Do latim cautu,
«precaução» ou «acautelado; defendido», particípio passado de
cavere, «acautelar».
Fotos: CorreiaPM, domínio público.
Mapa de Tourém, Randim e Couto Misto: http://www.planeamentourbanistico.xunta.es/siotuga/visor.php?hc_location=ufi
http://www.igeoe.pt/downloads/file143_pt.pdf
http://sd1raia.webnode.com.pt/news/tratado-de-lisboa-de-1864/
http://www.coutomixto.org/index.htm
http://elpais.com/diario/2006/07/30/domingo/1154231557_850215.html
http://coutomixto.blogspot.com.es/
http://www.igadi.org/arquivo/te_se03/couto_mixto_unha_republica_esquecida.htm
http://usuaris.tinet.cat/sag/pepe/cotomixt.htm
http://www.crtvg.es/tvg/a-carta/xente-con-xente-nas-fronteiras-do-couto-mixto-castromil-e-goian-03-12-2011
http://www.jornalmapa.pt/2014/06/17/a-aldeia-do-cambedo-e-o-couto-mixto/
Mapa de Tourém, Randim e Couto Misto: http://www.planeamentourbanistico.xunta.es/siotuga/visor.php?hc_location=ufi
http://www.igeoe.pt/downloads/file143_pt.pdf
http://sd1raia.webnode.com.pt/news/tratado-de-lisboa-de-1864/
http://www.coutomixto.org/index.htm
http://elpais.com/diario/2006/07/30/domingo/1154231557_850215.html
http://coutomixto.blogspot.com.es/
http://www.igadi.org/arquivo/te_se03/couto_mixto_unha_republica_esquecida.htm
http://usuaris.tinet.cat/sag/pepe/cotomixt.htm
http://www.crtvg.es/tvg/a-carta/xente-con-xente-nas-fronteiras-do-couto-mixto-castromil-e-goian-03-12-2011
http://www.jornalmapa.pt/2014/06/17/a-aldeia-do-cambedo-e-o-couto-mixto/
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